Sobre a falta

00:31 Kamila Siqueira 0 Comments

22/09/2015





Uma e meia da manhã. 
O sono não vem, mas aquela sensação estranha que a madrugada silenciosa traz já chegou. Eu me deito no escuro, na tentativa do silêncio ser menor, do sono ser maior, mas não consigo.
Eu sinto saudades. E é uma saudade esquisita porque não sei bem de onde vem. Eu poderia nomear algumas pessoas de quem poderia sentir saudades. Algumas pessoas que não vejo há tempos, um amor para quem tive de dar adeus depois de tanto tempo, uma amizade que acabou há anos e ainda me faz falta, outra que está aqui e tenho medo de perdê-la. Sinto falta do apoio que gostaria de ter em algumas questões e do abraço que precisava e não veio. Sinto falta de um cafuné, dos dedos entrelaçados, das palavras de carinho inesperadas. Eu tenho alguns bons motivos para sentir saudades. Mas não é deles que sinto.
Ao menos, acho que não. 

Uma e quarenta da manhã. Sento-me na cama, bebo água, encaro o escuro. Me faz tanta falta. Mas o quê? De que ou de quem é esse vazio aqui no peito? A quem pertence este espaço e quem o provocou? Gostaria de poder fazer mais para garantir que não perderei quem por aqui ainda está. Mas a gente não pode garantir nada, não é? Não existe coisa alguma que a gente possa fazer para garantir que não haverá ausência um dia. As pessoas são livres para ir, por mais que às vezes me doa.

Uma e quarenta e cinco. Deito-me de novo, encaro as estrelas de mentira que brilham no escuro. Gosto delas porque me lembram uma parte muito importante de mim mesma. Eu sinto falta de mim mesma às vezes. Sinto falta da convicção antiga que possuía, dos sonhos que antes pareciam-se mais com objetivos concretos, da quantidade de livros que lia e, principalmente, dos que escrevia. Há tanto o que escrever. Sinto saudades dos personagens que ainda rondam minha mente, implorando para sair, para que eu dê voz aos seus diálogos. Sinto falta dos meus antigos planos para mim mesma. Dos prazos traçados, das esperanças, das certezas quanto ao futuro. Sinto falta de não ter tanto medo. De dar passos no escuro. De mergulhar fundo sem dar ouvidos às advertências que tentam me segurar. De sentir à flor da pele sem me preocupar com os julgamentos. Sinto falta de algumas canções, de algumas memórias, de alguns costumes e das luzes de natal. 

"As coisas mudaram." Digo a mim mesma.
As coisas mudaram.

Duas horas da manhã. Durmo.

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