Indulgência
Algum tempo atrás, eu rezei por você. Não por você ser alguém importante para mim, não por estar entre as pessoas por quem peço e agradeço. Eu nem me lembro que você existe, na maior parte do tempo. Mas é que seu nome surgiu numa mesa de bar, em meio à conversa fiada de um sábado à noite e eu soube que você não estava bem. Nada bem.
Eu rezei por ti porque eu sei que você não é dessas pessoas que rezam ou que acreditam e você sabe que minhas orações estão presentes até mesmo quando preciso muito que o semáforo feche para que eu não perca o ônibus. Eu rezei para que ficasse bem.
Eu nunca desejei sua dor, mesmo você tendo causado a minha. Nunca, nunca, nunca mesmo. Eu nunca me alegraria com o seu sofrimento. A chama da vingança não conseguiu acender-se em mim, por mais que a revolta com a bizarra situação que vivemos pudesse se apossar do meu coração. Eu desejei que tudo passasse logo. E que você ficasse bem, como eu fiquei.
Sempre senti que havia uma ponta solta nessa história. Pelo modo abrupto como tudo aconteceu, por não termos nos visto quando tudo aconteceu e nem depois. Por nunca ter ouvido um pedido de desculpas teu. Por você nunca ter percebido quanta dor me causou. Eu sempre senti que havia algo faltando, o perdão que sempre esteve na ponta da minha língua, mas que de lá nunca saiu, pois você nunca o solicitou. Eu te perdoei e rezei muito para que você também se perdoasse. Para que você também vivesse intensamente o caminho que tem pela frente. Para que você também fosse feliz, como eu sou.
Acho que no fim, depois de um ciclo completo de estações, Deus me disse que o melhor é que eu mesma dê um nó nessa ponta solta e corte o resto fora. Acho que Ele me ouviu. Acho que está cuidado de você, mesmo que você não saiba ou não queira.
Fique bem.