Abalo sísmico

01:56 Kamila Siqueira 0 Comments

  17/12/2016



  Suspiro.
  - Mas é que nós humanos temos um milhão de placas tectônicas dentro da gente e placas tectônicas não permanecem imóveis! - Pausa. Outro suspiro. - Quando eu digo que tô bem é porque estou mesmo. Eu tô legal. Mas, você sabe, as placas se movem milimetricamente a todo instante. Elas estão sempre se encostando ou se afastando, raspando uma na outra, desgastando-se e separando-se. E você sabe o que acontece quando placas tectônicas se movem, não sabe?
  Cinco segundos de silêncio.
  - Terremotos.
  Três segundos de silêncio.
  - Isso. Terremotos.
  Um silêncio mais longo do que aqueles que acontecem após desastres naturais.
  - Quando uma placa milimetricamente se move em minha vida, tudo desaba. Tudo. Eu não consigo segurar as minhas estruturas, não sei como sustentá-las. Não sei como me sustentar. Quando você me pergunta se estou bem e eu digo que sim, juro que estou dizendo a verdade. Mas no fundo eu também sei que a qualquer momento alguma coisa vai se mover, milimetricamente, e que tudo pode desabar em cima de mim. E eu não sei se já aprendi a lidar com essa insegurança.
  Os dedos que seguram a caneta tamborilam por três vezes, fazendo com que a ponta dela manche o papel.
  - O problema aqui é que você luta para continuar sentindo essa insegurança e não para superá-la.
  Cenho franzido.
  - Por que eu faria isso?
  O dar de ombros.
  - Porque é mais fácil. É mais seguro. Enfrentar todos esses medos e ter a certeza de que você vai ficar bem quando tudo desabar significa ter mais controle sobre a própria vida. E isso é assustador. Você já sabe como é estar no chão diante de todo o castelo de cartas desmanchado, já conhece exatamente o gosto da dor, sabe que do chão você não passa. Para você, é seguro cair. Você sabe como a queda é. Por outro lado, você não sabe como é encarar as adversidades dentro dos olhos e empinar seu nariz. Não sabe como é impor seus pensamentos e sentimentos quando alguém tenta passar por cima deles. Não sabe como é bater o pé com segurança e fazer o que é melhor para você. E não saber disso tudo traz um medo gigantesco, porque todos nós temos medo do desconhecido. Então você prefere permanecer frágil, prefere cair a todo instante, porque ao menos as consequências da queda você já conhece. - Pequena pausa. - Você sabe o que os países que sofrem com constantes terremotos fazem?
  - O quê?
  - Eles constroem edifícios mais seguros. Mais fortes. - Longa pausa- Você se lembra da história dos três porquinhos?
  - Claro que sim.
  - Você tem uma casa com quintal. E nesse quintal, você possui todo o material de construção que poderia ter. Você tem tijolos. Tem cimento. Tem areia, pedrinhas, tudo o que precisa. Mas você continua vivendo em uma casa de palha porque acha que assim é mais seguro. Porque acha que assim as coisas não vão mudar e que você vai conseguir manter todos perto de você e que se a casa cair, tudo bem, você já está acostumada com as quedas. Mas as quedas machucam. E você não precisa delas, você pode morar em uma casa de tijolos, você tem tudo em suas mãos para morar em uma casa de tijolos. Para não sofrer mais com as quedas.
  Longo, longo silêncio.
  - Construa sua casa, moça. Tome as rédeas da sua vida e não tenha medo das consequências disso. Não tenha medo das mudanças. A vida é sua, você pode fazer isso. Está tudo bem em construir sua própria casa. Está tudo bem. 

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